Diários Noturnos

Diários Noturnos

9 de janeiro de 2015

Fidelidade entre as pernas

Desde o meu primeiro inverno,
a madrugada é o espírito mais fiel
de que tenho notícia.

Vestindo vermelho ou negro,
tem, inacreditavelmente,
o mesmíssimo semblante.

Um pescoço alongado,
olhar de quem assiste
a mesquinhez da existência
de um altar pecaminoso,
lábios levemente rachados,
hálito amadeirado
e as maçãs do rosto
que dão nas vistas.

A madrugada não engana
que entre as suas magras pernas
há um vale profundo.

Sem hesitar em lhe dar a resposta 
para quaisquer que sejam 
as suas dúvidas,
a madrugada não joga sujo
nem foge a cara à tapa.

A madrugada não abandona,
ela permanece.
Faz do tempo, oh danada,
uma estátua infantil
pregada na testa.

Ourives do silêncio,
a madrugada trabalha
e batalha,
com sua navalha,
na escultura
utópica da solidão,
alcançando
a sua forma
mais fina.


A madrugada,
está beijando,
devotamente,
a minha boca
com a língua.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Quem (sol) eu:

Minha foto
'O ar está tão carregado de espíritos que não sabemos como lhes escapar.'(Goethe in Fausto)

Seguidores